sexta-feira, 26 de agosto de 2005

O SÓTÃO DAS NOSSAS RECORDAÇÕES


O mundo imaginário da nossa infância é povoado pelas coisas mais belas e fantásticas que hoje recordamos com um sorriso de saudade.

Quantas vezes dizemos: "quando eu era miúda...". É verdade, quando nós éramos miúdas sabiamos brincar ao "faz-de-conta" e a nossa imaginação não tinha limites. Eramos tudo o que queriamos ser e a nossa tendência era de imitar os adultos. Que pressa tínhamos de crescer!

Brincávamos às casinhas, às mães e filhas, aos maridos e "maridas", aos homens do autocarro, aos merceeiros, aos reis e raínhas, às professoras e eu sei lá que mais! Mas num cantinho do nosso "sótão" das recordações encontramos sempre algo de especial que nos marcou e que nunca esquecemos: uma foto, um objecto, um simples brinquedo arrumado há muito.

No meu "sótão" está a Milucha, uma singela boneca de pano. Estou a vê-la... A Milucha era de pano e, tanto quanto me lembro, tinha um chapéu preto, olhos azuis muito grandes e trancinhas amarelas feitas de linha. Foi da minha irmã e passou para mim, o que quer dizer que já fazia parte da família.

Tinha outras bonecas melhores e mais bonitas mas a minha preferida era aquela, vá lá saber-se porquê. As crianças são imprevisíveis... Minha amiga inseparável suportou sempre com o mesmo sorriso no seu rosto de trapo todas as minhas oscilações de humor, ora sendo alvo das maiores demonstrações de ternura, ora sendo agredida sem dó nem piedade.É verdade, o que a pobre sofreu quando me dava a fúria e a atirava contra a parede, chamando-lhe nomes...

"Por que fazes isso, Nini? - perguntava a minha irmã. "Porque sim!" E pronto, não havia mais explicações! Porque sim ou porque não é a lógica infantil e está tudo dito!

Mas enfim, tirando essas coisas (criança também tem "crises"...) ela era a minha grande companheira e confidente. Sim porque eu falava muito com ela, enquanto lhe compunha as tranças e as enfeitava com laços. E, até para ficar com um ar mais saudável, acrescentava alguma cor às suas bochechas com lápis vermelho...

Depois cresci e a Milucha começou aos poucos a saír da minha vida, como é natural. No entanto, ainda hoje, tantos anos passados, recordo com carinho aquela boneca desengonçada e um pouco suja, companheira das minhas brincadeiras.

Todas as bonecas de trapo com tranças para mim são Miluchas, sempre Miluchas. Não lhes fica bem outro nome.

Aquela já não existe. Dei-a a uma garota que a cobiçou. Parece quase ingratidão...

Querida Milucha, quero que saibas, lá no mundo dos trapos do tempo, onde talvez ainda exista alguma ínfima partícula da tua alma de boneca, que te amei e amo porque foste a grande amiga e companheira do tempo em que eu ainda brincava ao "faz-de-conta".

4 comentários:

Patricia disse...

Ola querida!!
To passando pra deixar um beijo e um lindo final de semana!!
Beijo no coração...

Teorema Editora disse...

A criança não procura razões atrás de estrelas.
Abraços.

Anna^ disse...

Adorei este teu post!!!!!
Há recordações da nossa meninice que nos fazem ainda hj sorrir...

Bjokas ":o)

Heavenlight disse...

Também tenho uma boneca assim... É a Verónica, que ainda hoje está na minha casa. A Verónica era a minha melhor aluna, a filha mais rebelde e a amiga mais sincera...
Também recordo com saudade uma cadeira pequyenina de madeira, pintada de vermelho, e um cordeirinho castanho que me seguia pelo jardim.

https://www.malhanga.com/musicafrancesa/becaud/au_revoir/

    Se fosses luz serias a mais bela   De quantas há no mundo: – a luz do dia! – Bendito seja o teu sorriso Que desata a inspiração Da minha...